quinta-feira, 6 de dezembro de 2007

A SEGUIR À CHUVA

a seguir à chuva sobeja irremediavelmente a beleza
a finura lamacenta dos gestos aliada às gotas laminadas

dedilhar as pedras ● de cócoras para o olhar dos outros

e porque intacta se afigura a imagem de ontem em mim
narro-a sobre a impressionante bondade deste retábulo:
três tomates maduros a competirem tamanho entre si
espetados no terceiro dente da forquilha, um e os outros
a sangrarem água por desprendimento ao ciclo vindouro

a beleza vertida pelas temíveis e ferozes mandíbulas:
pão e antídoto – quando cuidadosamente administrada
sugere inconstância violenta dos espinhos que a pele
aglutina, na medida em que o cérebro pastoral os semeia
sem nunca antever a força nodal das sombras que
autenticam o telúrico poder do retábulo em vivência

[mágico ceptro crescido inteiro na palma da mão]

os olhos lacrados ● autorização para rebolar na cama

esperar que termine a santa trovoada debaixo dos lençóis
retocar o retábulo antes de ele mesmo acontecer

a seguir à chuva recuperar os olhos bem secos
para que se mantenha fresco o óleo das imagens na retina
no dia depois dos dias, hoje depois do ontem e anteontem

enaltecer o retábulo ● caminhar limpo entre a tomatada



Porfírio Al Brandão [2007]

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