quarta-feira, 5 de março de 2008

PLÁTANO

vejamos a grossura da linguagem oculta
esse velho soldado vegetal
petrificado na pequena praça
um estandarte de anéis expeditos
cravado no rodapé da história
um marco bélico de insígnias benignas
saudemos com ele a fúria protocolar das estações
mordamos em sua honra
as milimétricas peças do grande relógio
porque a nossa robustez está no equilíbrio dos sentidos
no complexo sistema de vagões celulares

a sintonia carbónica lambe a efemeridade do futuro
cintila nas sílabas que o tempo trauteia
assim se engrossa esta linguagem a nós oculta
num primeiro olhar
(premonitória herança do dilúvio)
a linguagem ao sabor da folia de espectros inesperados
armadilhas arquitectadas aqui e ali
pelos anões que descansam
por turnos
nas ramagens mais gordas das árvores

celebremos este lugar
que o plátano há tantos anos come
há tantos anos digere sem perder firmeza
tonificando resplandecente
as folhas os ramos
os nós da camisa implacável
há tantos anos preso à cinérea jovialidade

celebremos esta praceta
atentemos na côncava alegria vinda dos espectros
– um gigantesco olho-de-mosca granítico
apontado ao céu

Porfírio Al Brandão [2008]

quarta-feira, 13 de fevereiro de 2008

um pulmão é banhado no escuro
e o focinho da poeira de um canteiro
pode ser o início da voz.
de uma tília infinita e equinocial
uma válvula de porcelana
e a perfuração redentora e métrica do corpo

num forno expiram rosas entrançadas
a serpente soprada interiormente
um castiçal raiado em corrente única
para calcinar ritmicamente o sangue
cegar os peixes loucos
e morrer durante a neve.

do fundo de uma mão há um interruptor estilístico
e as peras coadas a transbordar em orvalho
e uma lua pulmonar.
é a rasar as gárgulas que ateia o baptismo iluminado entre os charcos
e as cavidades do Inferno são uma zona em mármore cardíaca
e morrer dela
é uma rama de átomos.

cristina néry_fev 2008

quinta-feira, 10 de janeiro de 2008

encontro as searas e as bailarinas como um espaço de texto-viga apoiadas romãs no centro da terra. a verter. a garganta é uma localidade de circunferências um pescoço em válvula e o estendal. reluz a orquídea dourada da águas das cerejas prenhes e reluzem inchados meteoritos frutos a morrer num derrame na mármore. cristina néry

terça-feira, 8 de janeiro de 2008

Morro
Onde se deformam
os raios das árvores
não te consigo dizer
a força das substâncias
a coluna vertebral.

Deixaste-me somente
escorrendo os poros
entre lâminas
encaixadas na pele.
Havia um berço
de borboletas
em cima de um livro
escorriam sílabas.
Ainda tens a beleza
correndo-me as artérias rotas.
espalhaste-te tão somente
entre o sangue
eu perdi todas as veias.

Graça Magalhães